sábado, 28 de janeiro de 2012

Sobre a criação do imposto sobre grandes fortunas.

Inicio o presente artigo lembrando que não há norma constitucional em vão, ou seja, se determinada norma constitucional foi redigida e prevista no Texto Constitucional é porque ela é importante para o País e deve, obrigatoriamente, ser regulamentada e cumprida. A outra opção existente é retirar a norma constitucional de eficácia limitada do Texto Constitucional via Emenda Constitucional, desde que tal norma não seja cláusula pétrea.

Visto isto, resta claro que o art. 153, VII da Constituição Federal, que determina a competência da “União instituir imposto sobre grandes fortunas, nos termos de lei complementar”, deve ser regulamentado para que possa, enfim, ter eficácia plena. Além da previsão no Texto Constitucional, o imposto sobre grandes fortunas é mencionado no art. 80, III do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, que determina que compõem o Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza o produto da arrecadação do imposto sobre fortunas.

Portanto, não há que se discutir acerca da criação do imposto sobre grandes fortunas e nem sobre a sua constitucionalidade, pois tal imposto é constitucional. Mas o que há de ser discutido são alguns aspectos deste novo tributo.

O primeiro aspecto a ser debatido é que, ao contrário do disposto no art. 80, III do ADCT, imposto não pode ter destinação específica, ele deve compor o tesouro nacional; assim, já teríamos aqui um problema sério que é a destinação específica da arrecadação de impostos; o mais correto seria destinar uma parte do tesouro nacional para a erradicação da pobreza.

Outro aspecto a ser discutido é o que se entende pelo termo “grandes fortunas”. Primeiramente é preciso deixar claro que somente pessoas físicas, cidadãos, têm grandes fortunas; empresas não possuem fortunas, empresas possuem capital. Daí, concluímos que somente as pessoas físicas seriam contribuintes deste novo imposto a ser instituído, vez que as empresas não são detentoras de “grandes fortunas”.

E o “quantum” caracterizaria uma “grande fortuna” também é importante ser discutido. O atual projeto de lei complementar que pretende regulamentar o imposto sobre grandes fortunas traz como sua base de cálculo patrimônio superior a R$ 5 milhões, que seria tributado com alíquota de 1%; acima de R$ 10 milhões, com alíquota de 1,5%; e superior a R$ 15 milhões, com alíquota de 2%. Seriam tais valores grandes fortunas? Ou será que determinado valor menor já caracterizaria? Ou então algum valor maior.

Outra questão a ser debatida é o fato de que o Estado estaria tributando duas vezes sobre o mesmo fato gerador, ou seja, bitributando sobre a renda auferida pela pessoa física. Se um cidadão é empresário e consegue amealhar em alguns anos uma “grande fortuna” de R$5 milhões, entre imóveis e dinheiro investido, sobre tal montante ele já irá pagar anualmente o imposto de renda e passaria a também pagar o imposto sobre grandes fortunas sobre o mesmo montante. Seria isto correto? Creio que não.

Outro aspecto a ser abordado é o da efetiva arrecadação com tal imposto. Isto porque em outros países, como a França e a Espanha, impostos semelhantes sobre fortunas foram criados e depois extintos porque a nova tributação fez surgir um alto número de remessas de fortunas para o exterior no sentido de não ter que pagar tal tributo anualmente. E o resultado disto é a evasão de divisas, a diminuição de dinheiro circulando na economia nacional e a consequente redução do consumo e o aumento do desemprego de forma indireta.

Por fim, o último aspecto a ser refletido é a já alta tributação existente no País. Será que o que se arrecada atualmente não é suficiente para a erradicação da pobreza? Creio que é mais do que suficiente; basta ter vontade política e boa aplicação dos recursos para que tenhamos uma melhor distribuição de renda e erradicação da pobreza.

Portanto, entendo que tal imposto deva sim ser criado, já que há previsão constitucional não só do imposto em si como também do objetivo fundamental da erradicação da pobreza; mas tal novo imposto deve ser criado de forma responsável, sem que haja bitributação, a evasão de divisas e nem um acréscimo ainda maior na sobrecarga de tributação já existente.